Mês passado, comprei algumas revistas para ler numa viagem longa de avião e decidi escrever sobre minhas impressões dessa experiência controversamente inovadora. Escrevi esse artigo sobre como sempre fomos expostos a propaganda, só não na intensidade de hoje.
Neste, discuto o valor em comprar uma revista e saber qual vai ser o tema em comum das matérias. Por outro lado, não é possível escolher exatamente os assuntos e nem arrastar para cima para a próxima matéria na hora que enjoar do que estiver lendo, ou não se interessar minimamente pelo assunto. Quer dizer, pode, mas a revista tem conteúdo limitado e cuidadosamente curado, então se você virar as páginas na velocidade em que rola a tela, vai chegar na contracapa antes de absorver qualquer informação.
O ato de ler as revistas me fez prestar mais atenção no assunto e percebi que, em um mundo onde o bombardeio de notificações é a nossa realidade, algo curioso está acontecendo: o material impresso está voltando com força. Além do retorno de outras tendências nostálgicas, é uma resposta pragmática à sobrecarga digital do doom scroll que estamos sentindo.
Quando Sabrina Carpenter foi fotografada por paparazzi em janeiro cobrindo o rosto com a edição da Vogue que trazia ela própria na capa, a imagem viralizou porque uma celebridade da Geração Z usou os recursos digitais como uma forma de divulgar uma mídia física.


Não foi surpresa quando a newsletter Bits to Brands, referência em marketing e branding, lançou uma edição impressa exclusiva no início deste ano. O assunto do “Offline ser o novo luxo” já era pauta para a Beatriz Guarezi, e a publicação em papel revelou uma estratégia interessante não só para comprovar o seu ponto, mas também para criar uma experiência diferenciada para seus leitores.
Diversas marcas têm explorado o formato de "jornais" impressos como estratégia de marketing e relacionamento. Esse movimento representa uma resistência ativa à saturação digital, oferecendo algo que as plataformas online não conseguem: uma experiência tátil, sem notificações e sem a competição constante por atenção.
Conversei sobre o tema com uma amiga que é editora de moda, a Patricia Tremblais, que aponta que o papel traz um sentimento de exclusividade. “Num mundo totalmente digitalizado, receber um convite impresso, por exemplo, permite não só que a marca possa brincar com os sentidos, seja com texturas ou cheiros, mas também proporcionar uma experiência inusitada ao cliente", opina.
Ao mesmo tempo que a relevância de uma revista tem validade — os temas das matérias são pertinentes no momento de impressão — as edições são eternas. Uma revista de dez anos atrás, encontrada em uma gaveta, ainda funciona perfeitamente - não precisa de atualizações de sistema, não tem paywall, não pede para aceitar cookies. Ela simplesmente existe, e por mais que os assuntos não sejam atuais, o fato de terem sido selecionados para serem destacados naquela impressão, naquela matéria, naquele momento, traz um significado ainda mais profundo.
“Pelo fato do timing da revista ser diferente do timing digital, isso faz com que o impresso normalmente seja um material mais elaborado. Ler uma revista é como ler um livro, ela é toda pensada, a ordem das seções e a jornada de leitura. Para mim, folhear uma revista impressa é um ritual, dedico um momento para isso sem distrações. É o mesmo sentimento de ver um álbum de fotos", diz Patricia.
Sua experiência trabalhando na Vogue, na revista ELA (suplemento de moda do Jornal O Globo), e como diretora de estilo da revista do Shopping Cidade Jardim traz uma perspectiva única ao assunto. “Para quem trabalha com moda e precisa estar sempre estudando e pesquisando, buscar referências só no digital é muito limitador. Não necessariamente aquela imagem ou matéria que você está vendo na revista impressa você encontrará online.” Hoje, a Pati mora em Paris e segue colaborando com todas as revistas.
Outra vantagem do material impresso sobre o conteúdo digital é que não tem algoritmo decidindo o que você vai ver em seguida. Quem decide é a equipe de jornalistas, editores e contribuintes que trabalharam naquela edição para que ela fosse eternizada de forma impressa.
Enquanto a inteligência artificial calcula o próximo conteúdo que devemos consumir, a inteligência analógica de uma revista nos permite descobertas acidentais. Não tem notificações interrompendo sua concentração. E, principalmente, não tem a sensação de infinitude que caracteriza o scroll das redes sociais. Quando você chega ao fim de uma revista ou jornal, você realmente chegou ao fim. Hoje em dia isso pode ser considerado uma conquista e tanto.
Este movimento certamente não vai substituir o digital. Isso já é impossível. Mas demonstra que existe espaço para ambos. No fim, o retorno da popularidade do impresso não é sobre rejeitar a tecnologia, mas sobre reconhecer que nem todas as experiências precisam ser otimizadas, rastreadas e interrompidas.